O DISCURSO DE BOLSONARO NO PAINEL DO CLIMA É MAIS UMA DE SUAS FAKE NEWS

 



Acostumado a dizer e desdizer, afirmar agora e negar depois, declarar ontem e refutar amanhã, gerando mentira e desinformação com o objetivo de confundir para governar, o governo Bolsonaro fez hoje mais uma das suas mais impudicas jogadas. Dessa vez, em frente a uma plateia internacional qualificada, contou suas pataratas cheias de promessas sem contexto, imprevisões e palavrório vazio, porque as suas ações cotidianas e suas crenças tiram a credibilidade de seu discurso. Um dia depois de ter churrasqueado em apoio ao seu anti-ministro do meio-ambiente, um dos maiores inimigos das florestas, dos bichos e dos povos tradicionais, ele sobe à tribuna com a única ambição de vender seu peixe malcheiroso - precisamente ele que até agora desmontou as políticas ambientais, incentivou a mineração em terra indígena, deu de ombros aos criminosos ambientais, criminalizou entidades não governamentais ilibadas, entre tantos outros gestos cotidianos que têm levado o Brasil a viver algumas das catástrofes ambientais mais graves da nossa história, desmatamentos e queimadas nelas incluídas.

Quem acompanha um pouco dos assuntos ambientais não tem dúvida de que aquelas promessas não condizem com as atitudes do atual governo. Bolsonaro não pode oferecer o que ele não tem: a convicção de que a natureza precisa de proteção e de que ele, como presidente, tem uma responsabilidade direta com esses fatos. Negacionista, Bolsonaro não acredita no aquecimento global, nem que ele exista, nem que ele seja produzido por fatores antrópicos. Sem isso, suas palavras ficam sem espírito. Provavelmente, a tal “neutralidade climática” seja um conceito que ele não entenda e uma missão que ele pense em delegar aos governos futuros, eximindo-se de seu próprio dever enquanto segue de bravata em bravata. Se não, vejamos: por que ele agiu ativamente para acabar com o Fundo Amazônia? Por que em seu governo a floresta sofre constantes e reiterados ataques, com recordes mensais de desmatamento? Por que ele demitiu o presidente do INPE e questiona os dados da ciência que não lhe agradam? Por que ele demite e persegue todos aqueles que querem levar a sério as parcas leis ambientais, ele mesmo um dos seus violadores (não esqueçamos o caso em que foi condenado por pescar em área de proteção integral, em Angra dos Reis)? Por que o IBAMA e demais órgãos foram sucateados e os agentes sérios perseguidos e demitidos? Por que? Por que?

Bolsonaro é um caçador nato, um pescador sem lei, armado até os dentes. Sua cabeça pensa como tal, no máximo segundo a lógica do ambientalismo capitalista, barato e interesseiro, daqueles que guardam animais para a diversão do abate e veem a floresta como fonte de renda – leia-se, árvore a ser derrubada, vendida, transformada em dólar. No seu modelo de mundo, a natureza é só um objeto a ser explorado em vista do desenvolvimento – qualquer que ele seja – e da acumulação. Um empecilho, afinal, para o progresso. Quando fala em coisas como “aprimoramento da governança da terra” e em coibir o “desmatamento ilegal”, provavelmente ele tenha em mente legalizar garimpos em terras indígenas e tornar legítima a ação dos madeireiros e outros ecocidas. Tudo em nome desse progresso que, na sua visão de mundo empobrecida, os países ricos querem impedir o Brasil de conquistar. Além disso, o que ele chamou de “paradoxo amazônico” é uma anomia teórica inventada por ele mesmo e seus súditos.

Além de falar do que não acredita, hoje Bolsonaro mentiu mais uma vez, ao afirmar que aumentou os recursos para fiscalização e ao minimizar os dados dos desmatamentos. Diante daquela plateia, isso é tão grave quanto usar o santo nome de (seu) deus em vão, o pecado dos pecados: ninguém há de dar razão para um presidente que se elegeu prometendo sair do Acordo de Paris e que, mesmo não cumprindo a promessa formalmente, o fez na prática. A cambalhota ideológica de hoje foi só uma encenação. O amigo de Trump (o derrotado), ficou sozinho com sua gravata feia e seu anti-ministro sem sal. Ao que consta, nem o anfitrião ficou para ouvi-lo.

Oxalá não fosse assim. Oxalá o governo levasse a sério um assunto de tamanha gravidade, ajudando o país a preservar o que ainda resta da biodiversidade e da vida dos indígenas e demais comunidades tradicionais. Oxalá a mentira de hoje seja a última. Se assim o fosse, a primeira medida coerente seria trocar o seu anti-ministro e deixar de celebrá-lo com churrascos – precisamente com carne bovina, um dos maiores problemas ambientais do Brasil. Mas isso seria pedir demais.








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