SENHOR MINISTRO, CONHEÇA CHICO MENDES, A AMAZÔNIA E O BRASIL.







Senhor ministro do meio ambiente do Brasil, 

Foi triste para nós e vergonhoso para o senhor a tal declaração de que não se importa com Chico Mendes. Ao desconhecer um dos brasileiros mais importantes na luta em defesa da Amazônia, o senhor deixou claro de que lado está. Não que a gente tivesse dúvidas. Não. As coisas sempre estiveram muito claras entre nós. Mas a afirmação é tão vexatória e indecorosa que nos pegou de assalto e só pode ser comparada à intenção de seus colegas que pretendem riscar Paulo Freire da nossa história. Saiba, senhor ministro, que homens como Chico Mendes e Paulo Freire não morrem nunca. Não insista. E se é de vaidade que tratamos aqui, a insignificância da sua presença ministerial não compete nem de longe com a grandiosidade de histórias como as desses dois homens.

Sabe o que é pior, excelentíssimo? É que, ao desconhecer Chico Mendes, o senhor desconhece o Brasil, principalmente aquela parte dele que esse famoso seringueiro defendia, a Amazônia. O senhor sabia que foi essa luta em favor da floresta que fez esse homem tão ilustre ao redor do mundo? Já pensou que a sua missão ministerial deveria dar continuidade à luta dele, aos seus sonhos e ideais? É por isso que a sua ignorância sobre esses assuntos, televisionada em horário nobre, parece realmente apavorante. Vamos falar sério: o senhor já ouviu falar desse pedaço do Brasil, seus habitantes, suas imensas paisagens, suas riquezas, seus bichos e plantas? O senhor já viu uma andiroba em pé, um babaçual inteiro, uma vitória régia (não vale a do Kew Gardens de Londres, hein?). O senhor já viu uma anta? Sabe o que é o voo de araras em pares, gritando sobre a copada das árvores? Uma jiboia, uma sucuri, uma onça... sabe o que é? E um boto rosa, já ouviu falar? O senhor já imaginou os vários tipos de óleos, resinas, aromas, condimentos, plantas medicinais, tinturas e tantos frutos que se espalham por aquelas imensidões? Já viu de perto o cupuaçu, o murici, o caju, a bacaba e a manga? O senhor já ouviu o silêncio lento do Rio Amazonas, debruçando-se sobre o mar em mil porções de outros rios, de outros nomes, de outras matas e vertentes? O senhor já provou um pato no tucupi, deixou um tacacá lhe amortecer a língua, comeu um peixe moqueado, um pirarucu de sol? Já viu a chegada do açaí no Ver-o-peso? Pequiá, pupunha... sabe o que é isso?

O senhor já olhou nos olhos de um indígena? Já pisou na lama de uma periferia de Manaus, Belém, Porto Velho, Macapá? Já ouviu falar dos moradores daquelas terras? Das mais de 1400 comunidades quilombolas? Dos povos ressurgidos e resistentes? Dos migrantes da borracha? O senhor sabe o que é a vida de uma quebradeira de coco babaçu? Já estudou a rotina dos ribeirinhos, que são os verdadeiros guardiões da floresta em seus inúmeros lagos santuários? Já ouviu falar dos artesãos e pescadores, das inúmeras cooperativas, sindicatos e movimentos? Dos posseiros e sem terra, já tomou conhecimento? Dos colonos e migrantes, dos habitantes urbanos, dos pequenos povoamentos, das grandes capitais? 

O senhor já ouviu falar do casal José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva, assassinados em 24 de maio de 2011 e homenageados na ONU como “heróis da floresta”? E Dorothy Stang, o senhor conhece sua história e já sabe que a luta dessa mulher deveria ser a sua também? E já viu alguma foto de Sebastião Salgado? Sabe aquela de uma cena do enterro de 19 trabalhadores rurais sem terra mortos no massacre de Eldorado dos Carajás, em 1996? Já ouviu falar desse fato?

O senhor já pensou que tudo isso existe? 
Já passou pela sua cabeça que o cargo que lhe coube ocupar exige isso? Que um ministro não pode ignorar o objeto da sua responsabilidade? 

Convenhamos senhor ministro, da próxima vez, fique calado. E enquanto isso, pedimos encarecidamente, faça uma viagem ao coração do Brasil. Deixe seus gabinetes perfumados. Não tenha medo. Do contrário, com o perdão da verdade: peça pra sair, porque a história lhe cobrará um preço alto pela sua ignorância desrespeitosa.



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