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Mostrando postagens de dezembro, 2016

O POMPIDOU DE PARIS É UMA CAVERNA PLATÔNICA: sobre as ilusões de Magritte*

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A exposição organizada por Didier Ottinger, no Centre Georges Pompidou, em Paris, dá prova não só da incontornável grandiosidade estética da obra de René Magritte, mas sobretudo de seu conteúdo filosófico e de sua poética ao mesmo tempo incômoda e fascinante. Poucos pintores foram tão enigmáticos como ele. Quem visita as cinco salas da exposição sai de alma sangrada, porque adentra no mundo surreal do pintor belga e o acompanha aos seus abismos mais profundos, onde somos deixados sozinhos. Se a traição das imagens é o título da exposição, somos nós os traídos. Depois de ter nos induzido à aventura, Magritte nos deixa perdidos nos labirintos de seu mundo de sombras e ilusões. Isso porque, desde seu encontro com o quadro Chant d’amour , de Giorgio Chirico, em 1923, Magritte dedicou-se a pensar com imagens e, sobretudo, a mostrar o quanto o pensamento é limitado e o quanto palavra e imagem, malgrado suas similaridades, falham em dizer e em mostrar o mundo. A estétic

EU, VOCÊ, AS PALAVRAS E AS COISAS: 200 mil vezes, obrigado.

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Sou de família migrante. Em três gerações fizemos o percurso dos desterrados, vagando por três diferentes regiões do mundo. Meus bisavós partiram da Alemanha em busca de terra na América do Sul e deram em Monte Negro, no Rio Grande do Sul, em meados do século XIX. Depois, uma parte da família seguiu para o noroeste do Estado, divisa com a Argentina, na região das missões, onde a geração dos meus pais cresceu e eu e meus irmãos nascemos, até quando chegaram os encartes coloridos com as propagandas das terras do norte do país, que a gente chamava, genericamente, de mato grosso (assim, no minúsculo, porque esse era o nome para uma terra desconhecida, cheia de jararacas, onças e índios – o modo como, nessas priscas eras, se pensava o desconhecido, quase sempre beirando o preconceito). Eu mesmo, com meus dez anos de idade, folheei entusiasmado um desses folhetos que apresentava o progresso nas terras distantes, o dinheiro e a prosperidade que estavam disponíveis no alto do mapa. Me

CASA XITLA, O UMBIGO DO MÉXICO

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O que é uma casa? Heidegger escreveu que é proteção para o ser lançado no mundo, cujo fundamento é o débito existencial do nada pleno de possibilidades. Casa, logo, é alternativa, escolha, serena proteção diante do aberto. Casa é resguardo. Mas não o prédio, apenas, pois casa, é nome concreto para a coisa abstrata que a gente, por falta do que dizer, chama de encontro . Casa se faz na forma de abraços, noites de conversa, oficina de sonhos que se derramam pelas janelas, de manhã,  na forma de flores, essas coloridas abreviaturas de céu que a natureza dispõe ao nosso olhar e que a gente, para sobreviver aos escuros, leva nas algibeiras. Casa é experiência de infância, memória do que fomos e compromisso com o que queremos ser, agora mesmo, amanhã, ano que vem. Casa é projeto de ser, afinal. Casa é pra onde a gente volta depois que o sonho distendeu a fronteira do possível – casa é porto. Mas vida, vida não. Vida é viagem, campo desconhecido, indizível incógnita, outra vida