“QUERIDA AMAZÔNIA” É UMA DECLARAÇÃO DE AMOR DO PAPA FRANCISCO À NATUREZA
Em sua
exortação apostólica publicada no dia 12 de fevereiro de 2020, o Papa Francisco
declara seu amor à Amazônia. Não é só pelo título. “Querida Amazônia” é, inteira, uma
celebração lúcida e festiva de um amor universal do ser humano pela natureza da
qual ele é parte. Todo documento é, por isso, uma carta amorosa dirigida às
pessoas, aos bichos e à natureza que formam esse cenário sedutor e apaixonante.
Ao escrever que ama a Amazônia, chamando-a de “querida”, o Papa (e a Igreja
toda que ele representa) diz que ama as floresta de várzea, os manguezais, os campos
naturais, cerrados e savanas; o Papa ama as planícies e cordilheiras, os 104
sistemas de paisagens, as 55 mil plantas, as mil aves, os 300 tipos de mamíferos;
o Papa ama os sapos e os outros 163 anfíbios, os 550 répteis e os 3 mil peixes
que vivem na Amazônia. Todos são “queridos” de Francisco. O papa ama cada uma das
208 mil pessoas que formam os 163 povos indígenas da Amazônia. O papa ama o pato
no tucupi, o tacacá, o peixe moqueado, o pirarucu de sol, o açaí,
o pequiá, a pupunha, a calderada de tambaqui, o matrinxã na brasa e todas as outras comidas
amazônicas. E porque ama isso, o Papa odeia o latifúndio pecuarista e as
queimadas que ele promove, a mineração, o garimpo, a biopirataria, o trabalho-escravo
e a violência contra indígenas, posseiros, quilombolas, ambientalistas...
E porque quem
ama conhece e cuida, o papa reúne nessa carta de amor, uma série de informações
e denuncia como injustiça e crime o que está acontecendo na Amazônia em nossos
dias. A degradação da floresta, a extinção dos seres vivos e o desrespeito às
comunidades locais transformam Amazônia em um pesadelo social. O papa, ao
contrário, como bom amante, fala de quatro sonhos: um sonho social, um sonho
cultural, um sonho ecológico e um sonho eclesial. Francisco, contudo, sonha com
os pés no chão. Por isso, faz desse documento histórico um convite ao cuidado.
A Amazônia, nesse caso, é só um pretexto para ele retomar os pontos principais
de sua testemunha de defesa do meio ambiente.
Ora, uma carta
de amor só pode ser escrita em linguagem afetiva e poética. O papa cita
Vinicius de Moraes, Pablo Neruda, Pedro Casaldáliga, Jorge Márquez, Sui Yun,
Euclides da Cunha, entre outros, para falar de seu bem-querer. O texto é
enxertado pela poesia que é produto de uma amorosidade experimentada por todos
aqueles que vivem maravilhados pelas riquezas transbordantes da natureza
amazônica. Com isso, ele quer romper com a nossa insensibilidade, apatia e
indiferença que nos abatem. Talvez ele lembre o que disse Euclides da Cunha: “A
Amazônia, ainda sob o aspecto estritamente físico, conhecêmo-la aos fragmentos.
Mais de um século de perseverantes pesquisas e uma literatura inestimável, de
numerosas monografias, mostram-no-la sob incontáveis aspectos parcelados. (...)
A inteligência humana não suportaria,
de improviso, o peso daquela realidade portentosa” (Euclides da
Cunha, Um paraíso perdido). O papa, depois do Sínodo, está maravilhado.
Com essa Exortação, Francisco confirma sua
filiação à causa da floresta e nos convoca ao mesmo gesto que nasce não apenas
da lógica e do intelecto, mas sobretudo da proximidade amorosa e carinhosa. Com
isso, ele também diagnostica um dos motivos da apatia humana em relação à
emergência climática: aquilo que o escritor americano Richard Louv chamou de
“déficit de natureza”. Segundo o autor, esse é um transtorno psicológico que
impede as pessoas de prestarem atenção ao mundo natural. Como Louv acredita que
as crianças precisam ser educadas próximas da natureza (atualizando a tese que,
no limite, já lemos em Rousseau), ao escrever para a “querida Amazônia”,
Francisco clama por uma nova educação dos seres humanos. Uma educação ecológica
plena. Uma educação pelo amor. Um convite à responsabilidade.
Gracias!!
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